Alterações genéticas preditoras de resposta ao rucaparibe em pacientes com câncer de ovário recorrente - Oncologia Brasil

Alterações genéticas preditoras de resposta ao rucaparibe em pacientes com câncer de ovário recorrente

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Análise post-hoc do estudo ARIEL2 indica que altos níveis de metilação do promotor do gene BRCA1 e mutações nos genes RAD51C e RAD51D podem predizer resposta à rucaparibe de forma semelhante às mutações de BRCA1 e BRCA2. 

 

ARIEL2 é um estudo multicêntrico, de fase II e braço único, que avaliou o uso do inibidor da PARP rucaparibe em pacientes portadoras de carcinoma de ovário de alto grau em dois cenários distintos. No cenário 1, foi avaliado o uso da medicação em 204 pacientes com recorrência tumoral com critérios de sensibilidade à platina e que possuíam alterações moleculares na via da recombinação homóloga (RH), sendo elas mutações somáticas ou germinativas de BRCA1 ou BRCA2 e/ou assinaturas gênicas de perda de heterozigozidade (PH). Pacientes nesse cenário recebiam tratamento com rucaparibe 600mg por via oral, duas vezes ao dia, de forma contínua, até progressão de doença ou descontinuação por qualquer motivo.  

O desfecho primário para essa análise era de sobrevida livre de progressão (SLP). Em pacientes com BRCA mutado ou com assinatura gênica de PH, o uso de rucaparibe trouxe ganhos em SLP em relação aos pacientes BRCA wild-type sem assinatura gênica de PH (medianas de 12,8, 5,7 e 5,2 meses respectivamente). Essa primeira fase do estudo já demonstrava que assinaturas gênicas de deficiência da RH podem ser usadas para identificar pacientes sem mutações de BRCA que se beneficiem do uso de inibidores da PARP.  

No cenário 2, foram incluídas 287 pacientes com doença recorrente após exposição a três ou quatro linhas de tratamento prévias, tanto no contexto de sensibilidade quando de resistência à platina. O desfecho primário dessa análise era taxa de resposta objetiva (TRO). Para essas pacientes politratadas, a TRO foi de 31% para pacientes com mutações de BRCA, 6,8% para pacientes com assinaturas de PH e 5,6% para pacientes com BRCA wild-type sem assinatura gênica de PH.  

 

Utilizando as informações das pacientes incluídas nas duas partes do estudo, foi realizada uma análise combinada post-hoc que avaliou a relação entre alterações genéticas ou epigenéticas na via de RH e sensibilidade à rucaparibe. Dentre as 491 pacientes analisadas, mutações patogênicas somáticas ou germinativas de BRCA1/2 foram detectadas em 28% dos casos. Corroborando análises prévias, a TRO com uso de rucaparibe foi de 48,2% para mutações somáticas e 45,5% para mutações germinativas de BRCA, confirmando que o benefício clínico independe da natureza somática ou germinativa dessas mutações. Além de BRCA1/2, foram analisados outros 28 genes da via de recombinação homóloga (ATM, ATR, ATRX, BARD1, BLM, BRIP1, CHECK1, CHECK2, FANCA, FANCC, FANCD2, FANCE, FANCF, FANCG, FANCI, FANCL, FANCM, MRE11A, NBN, PALB2, RAD50, RAD51, RAD51B, RAD51C, RAD51D, RAD52, RAD54L e RPA1). Pacientes sem mutações de BRCA, mas com mutações em quaisquer outros desses genes tiveram uma SLP mediana de 5,7 meses e TRO de 16,7% com uso de rucaparibe, o que não diferiu de forma significativa dos desfechos dos pacientes sem mutação de BRCA ou de algum desses 28 genes (SLP 3,7 meses e TRO de 11,7%).  

 

Baseado em evidências anteriores de predição de sensibilidade, análises isoladas foram realizadas para os genes PALB2RAD51C e RAD51D. A TRO em pacientes com mutações de RAD51C/D chegou a 71,4%. Com exceção de um respondedor que tinha mutação de NBN, todos os outros pacientes com benefício clínico que eram wild-type para BRCA tinham alterações patogênicas em RAD51C/D, categorizando esse gene como um preditor de resposta ao tratamento com rucaparibe.  SLP mediana em pacientes com mutações em RAD51C/D foi numericamente muito similar aos pacientes com mutações de BRCA (11,0 e 7,8 meses respectivamente – HR 1,52; IC95% 0,67–3,44; P = 0,32). 

 

Do ponto de vista epigenético, foi avaliado o impacto da presença de metilação do promotor dos genes BRCA1 e RAD51C por meio de PCR específico para metilação em material de 321 amostras disponíveis para avaliação de tecidos arquivados e/ou em material de 320 amostras coletadas na ocasião do screening para início de rucaparibe. A frequência de metilação foi de 16,8% para BRCA1 e 1,6% para RAD51C nos tecidos arquivados e de 13,5% para BRCA1 e 2,6% para RAD51C em tecidos pré-screening.  

Análises de 21 amostras de pacientes incluídos na primeira parte do estudo, no cenário de recorrência platina-sensível, já haviam sido publicadas e confirmaram que metilação do promotor de BRCA1 em homozigose ou heterozigose era preditora de resposta clínica à rucaparibe. Usando um ponto de corte de 70% de metilação, a SLP foi maior para pacientes com altos níveis de metilação do promotor de BRCA1 pré-screening quando comparado àqueles com baixo nível de metilação ou não-metilados (medianas de 7,8; 2,7 e 4,3 meses respectivamente). SLP mediana dos pacientes com alto nível de metilação pré-screening foi similar à de pacientes com mutações de BRCA (7,8 e 9,0 meses respectivamente – HR 0,84; IC95% 0,50–1,42; P=0,52).  

 

Análises também foram realizadas para avaliar como as vias de sinalização celular não-relacionadas à RH poderiam modular a resposta à rucaparibe. Alterações de do ciclo celular incluindo amplificações de ciclinaEciclinaDCDK4/6 e inibições nos genes CDKN2A/B e CDKN1B são relativamente comuns entre pacientes wild-type para mutações de BRCA e estão associados a resistência à platina. Via de sinalização do AKT também está relacionada à resistência à platina, e inibição do AKT poderia ser uma estratégia para reversão de resistência de acordo com modelos celulares. Tumores que apresentavam alterações na via de sinalização do KRASNRAS ou BRAF na ausência de mutações de TP53 acabavam por fim não se confirmando como tumores ovarianos epiteliais de alto grau, e a ausência de resposta a Rucaparibe nesse contexto pode indicar necessidade de nova confirmação histológica.  

 

Em resumo, apesar de ser baseada em uma série pequena, análises moleculares do estudo ARIEL2 sugerem que mutações de RAD51C/D e altos níveis de metilação do promotor do gene BRCA1 são fatores importantes para predição de sensibilidade e benefício clínico com o uso de agentes inibidores da PARP, se assemelhando às mutações dos genes BRCA1/2. É importante também considerar que vias de sinalização não relacionadas à HR podem configurar mecanismos de resistência ao uso de inibidores da PARP.  

 

Referências:
Swisher, E.M., Kwan, T.T., Oza, A.M. et al. Molecular and clinical determinants of response and resistance to rucaparib for recurrent ovarian cancer treatment in ARIEL2 (Parts 1 and 2). Nat Commun12, 2487 (2021). https://doi.org/10.1038/s41467-021-22582-6