O uso do inibidor de PARP olaparibe para tratamento de neoplasias está usualmente indicado na presença de alterações nos mecanismos de recombinação homóloga, especialmente aquelas secundárias a mutações de BRCA1/2. No entanto, novos dados do estudo PAOLA-1/ENGOT-ov25 (NCT02477644), revelados no ESMO Congress 2019, indicam que o tratamento de manutenção com olaparibe e bevacizumabe pode ser benéfico para pacientes com câncer de ovário, independente do status de mutação de BRCA, com aumento expressivo da sobrevida livre de progressão (SLP).
O congresso da European Society of Medical Oncology, que ocorre em Barcelona de 27 de setembro a primeiro de outubro, contou com apresentação desses resultados pela Dra. Isabelle Ray-Coquard, na sessão oral sobre tumores ginecológicos. O estudo em questão avaliou pacientes com câncer de ovário, trompa ou primário de peritônio, de histologia endometrioide ou serosa de alto grau, estádios III-IV.
O câncer ainda é a quinta neoplasia mais comum em mulheres e o tumor ginecológico mais letal. Com a maioria das pacientes diagnosticadas em estádios avançados, o tratamento padrão precisa de contemplar diferentes modalidades terapêuticas, sendo usualmente constituído por cirurgia e poliquimioterapia baseada em platina (PQT), associada ao antiangiogênico bevacizumabe (bev), seguida de manutenção com bev em monoterapia.
Nesse estudo de fase III, as pacientes eram randomizadas após cirurgia e tratamento com PQT e bev, sendo incluídas apenas as que apresentavam resposta parcial ou completa ao tratamento inicial. A randomização era realizada em razão 2:1 para o braço de olaparibe 300 mg, duas vezes ao dia, por até 24 meses, associado a bev 15 mg/kg, a cada 3 semanas, ou para o braço de placebo e bev.
Tendo como desfecho primário a sobrevida livre de progressão (SLP) na população geral do estudo, esse foi o primeiro ensaio clínico a avaliar a eficácia de olaparibe como tratamento de manutenção, independentemente do status de BRCA. Com 537 pacientes recrutadas, o que se viu foi um ganho significativo em SLP (figura 1), com medianas de 22,1 meses para o braço do inibidor de PARP em comparação a 16,6 meses no braço do placebo (hazard ratio [HR] 0,59; IC 95% 0,49-0,72; p < 0,0001).
Os eventos adversos mais comuns foram hipertensão e anemia, com toxicidades graus 3 sendo reportadas em 57% das pacientes usando olaparibe e em 51% daquelas que usaram placebo. As interrupções e reduções de dose foram mais comuns no grupo de olaparibe (54% vs. 24% e 41% vs. 7%, respectivamente), bem como as taxas de descontinuação do tratamento (20% vs. 6%).
Em análises de subgrupo apresentadas pela autora, identificou-se ainda benefício mais expressivo não só para aquelas pacientes que apresentavam mutações em BRCA, mas também para aquelas que apresentavam deficiência em recombinação homóloga (DRH), independente do status de BRCA (figura 2). Nesses casos, a mediana de SLP foi de 37,2 meses em ambos os subgrupos, e os HR foram de 0,31 e 0,33 para pacientes com mutação em BRCA e DRH, respectivamente.
Os benefícios robustos na população geral do estudo aliado ao ganho inequívoco em populações com DHR, ainda que sem mutação de BRCA, fazem dessa estratégia uma nova opção para o tratamento de primeira linha das pacientes com câncer de ovário, trompa e peritônio estádios III-IV. A magnitude do ganho faz com que especialistas já considerem esse um potencial novo tratamento padrão para esse cenário, auxiliando ainda mais no aumento da sobrevida e na busca pela cura dessas pacientes.
O ESMO Congress 2019 acontece entre os dias 27 de setembro e primeiro de outubro em Barcelona, Espanha e reúne especialistas do mundo todo para discutir o que há de mais recente na pesquisa oncológica, com apresentação de dados que podem mudar a prática da oncologia e consequente promoção de um atendimento melhor ao paciente. Confira a cobertura no site www.oncologiabrasil.com.br/esmo-19, e nas nossas redes sociais.
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