Os estudos apresentados durante o Congresso da Associação Americana para Pesquisa do Câncer (AACR), realizado no mês passado em Chicago, continuam repercutindo em todo o mundo. Isso porque, a cada ano, a pesquisa de bancada se aproxima da pesquisa clínica, resultando em avanços significativos no tratamento de diferentes tipos de câncer. Este ano foi especial: os resultados apresentados para câncer de pulmão já estão sendo incorporados de forma rápida nos países que já têm os novos medicamentos aprovados pelas agências reguladoras.
A convite do Grupo Oncologia Brasil, o diretor médico da Oncologia Clínica e Hematologia do Centro Oncológico da Beneficência Portuguesa de São Paulo, Dr. William William Jr., fez uma atualização da principal plenária do Congresso, que abordou câncer de pulmão de não pequenas células metastático com enfoque especial em imunoterapia.
O especialista lembrou que, há até aproximadamente 10 anos, o tratamento para esse tipo de câncer era baseado em drogas citotóxica, “sem muitas diferenças entre os diferentes tipos de quimioterapia”. Esperava-se uma sobrevida mediana em torno de 10 meses, ou seja, mais de 50% dos pacientes já haviam falecido após um ano do diagnóstico.
Felizmente, muita coisa mudou nos últimos anos. “A imunoterapia foi aprovada já há alguns anos para pacientes com câncer de pulmão previamente tratados com platina, e hoje temos três drogas aprovadas nessa situação: atezolizumabe, pembrolizumabe e nivolumabe”, explicou William.
Esse foi o foco dos estudos apresentados no AACR 2018 foi em tratamento baseado em imunoterapia na primeira linha. O oncologista destacou os três mais importantes.
CheckMate -227
Classificado como um estudo bastante complexo, o CheckMate -227 na verdade reúne três estudos dentro de um só. Os pesquisadores avaliaram estratégias de imunoterapia comparadas a quimioterapia isolada com doublet de platina em pacientes com câncer de pulmão de não pequenas células.
William lembrou que existem vários desfechos primários que estão planejados para serem analisados nesse estudo, sendo que no AACR o primeiro desfecho primário foi apresentado, ou seja, sobrevida livre de progressão em pacientes com alta carga mutacional, maior ou igual a 10 mutações por megabase.
Os pacientes foram randomizados para receber quimioterapia versus imunoterapia, e, na análise desse desfecho, o que se avaliou foi a eficácia da combinação de ipilimumabe e nivolumabe versus quimioterapia. Resultado: “Houve melhora na sobrevida livre de progressão estatisticamente significativa e clinicamente relevante, com hazard ratio de aproximadamente 0,6”.
IMpower150
Trata-se de combinação de carboplatina, paclitaxel, bevacizumabe e atezolizumabe versus o controle de carboplatina, paclitaxel e bevacizumabe. Esse estudo já havia sido apresentado anteriormente com aumento de sobrevida livre de progressão, na comparação do braço de carboplatina, paclitaxel e bevacizumabe versus as três drogas acrescidas de atezolizumabe.
William destacou que existe um outro braço desse estudo com a combinação de carboplatina, paclitaxel e atezolizumabe que ainda não foi analisado porque os dados ainda não estão maduros. “Nessa AACR foi feita uma análise detalhada dos subgrupos que poderiam se beneficiar desse tipo de abordagem, e o que se observou é que a combinação com quatro drogas parece ser benéfica em todos os subgrupos estudados, independentemente da análise de PD-L1 e presença de mutações em EGFR ou alterações do gene do ALK. Nesse estudo, pacientes com mutação EGFR ou alteração no ALK só poderiam ser incluídos se já tivessem passado por terapia-alvo.”
KEYNOTE-189
O oncologista clínico avaliou que o estudo mais importante, por mudar a prática clínica de forma imediata, é o KEYNOTE-189. Nesse estudo, pacientes de câncer de pulmão de não pequenas células de histologia não escamosa foram randomizados para receber quimioterapia com platina e pemetrexede, seguido de pemetrexede de manutenção versus no braço experimental tratamento com platina, pemetrexede e pembrolizumabe, seguido de pembrolizumabe e pemetrexede de manutenção. Os desfechos primários desse estudo eram sobrevida global e sobrevida livre de progressão. O especialista frisou que, no AACR, foi demonstrado que a sobrevida global foi maior para os pacientes que receberam a combinação de platina, pemetrexede e pembrolizumabe com hazard ratio de aproximadamente 0,5. “Além disso, houve aumento da sobrevida livre de progressão e aumento das taxas de respostas. Mais do que o dobro responderam que receberam a combinação com imunoterapia versus quimioterapia isolada.”
Os pacientes que foram incluídos nesse estudo não poderiam ter mutação do EGFR ou ALK, mas podiam ser incluídos independentemente dos status de PD-L1. “Observou-se que o benefício da adição da imunoterapia à quimioterapia ocorreu em todos os subgrupos definidos por PD-L1 negativo, PD-L1 expressão entre 1% e 49% e PD-L1 expressão maior ou igual a 50%.”
Para William, no entanto, “mais importante do que isso foi que a sobrevida global em um ano chegou a aproximadamente 70%, o que é muito melhor do que o braço com quimioterapia, onde a sobrevida em um ano foi de aproximadamente 50%, que é o que nós esperaríamos baseando-se em controle histórico”.
O médico da BP fez questão de ressaltar que os resultados desse estudo já estão mudando a prática clínica diária em vários países. “A combinação de quimioterapia com carboplatina, pemetrexede e pembrolizumabe já é aprovada nos Estados Unidos para uso em primeira linha com base no estudo de fase 2 KEYNOTE-021 G, e agora corroborado pelos dados do estudo de fase 3 KEYNOTE-189″. William espera agora que a aprovação dessa combinação ocorra rapidamente no Brasil, em benefício dos pacientes. Ele acredita que a aprovação acontecerá independentemente de status de PD-L1.
Conclusão
William fez um balanço do cenário: “Partimos de uma situação onde muitas vezes esperávamos os resultados de PD-L1 para podermos indicar uma imunoterapia de primeira linha – até então, pembrolizumabe de primeira linha como droga única aprovada no Brasil para pacientes com PD-L1 maior ou igual a 50% -, e agora estamos numa situação em que, independentemente do status de PD-L1, poderíamos recomendar a combinação de quimioterapia mais pembrolizumabe para todos os pacientes, já que houve ganho de sobrevida global em todos os subgrupos estudados, independentemente da expressão de PD-L1”.
“Existe um pequeno aumento dos efeitos colaterais quando se adiciona imunoterapia à quimioterapia, e devemos prestar especial atenção à insuficiência renal aguda e nefrite. Portanto hoje, a partir da apresentação dos dados no AACR e diante desse cenário, trataríamos os pacientes de câncer de pulmão de não pequenas células sem mutação de EGFR e sem alteração do gene do ALK com a combinação de platina, pemetrexede e pembrolizumabe na primeira linha, independentemente da expressão de PD-L1.”
“Para os pacientes que têm histologia escamosa, sugerimos dosar o PD-L1 na amostra tumoral; esta for maior ou igual a 50%, esses pacientes devem receber pembrolizumabe na primeira linha. Se o PD-L1 for menor que 50%, devem receber quimioterapia baseada em platina na primeira linha. E, no momento da progressão, devem receber imunoterapia de segunda linha, que pode ser atezolizumabe, nivolumabe ou, no caso de PD-L1 maior ou igual a 1%, pembrolizumabe.”
Assista o vídeo com o especialista:
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