Boas práticas na coleta e processamento de amostras para testes laboratoriais em oncologia e oncohematologia - Oncologia Brasil

Boas práticas na coleta e processamento de amostras para testes laboratoriais em oncologia e oncohematologia

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A fase pré-analítica constitui etapa crítica no manejo de espécimes biológicos. Estima-se que responda por até 62% dos erros em testes laboratoriais.

Características específicas da fase pré-analítica de determinados testes laboratoriais aumentam, em muito, o grau de complexidade e, por consequência, a oportunidade de ocorrência de erros e não conformidades nos laboratórios. A fase pré-analítica inclui indicação do exame, redação da solicitação, transmissão de instruções de preparo do paciente, atendimento às instruções e procedimentos de coleta, acondicionamento, transporte, preservação e preparo da amostra biológica até o momento da efetiva realização do exame.

Coleta de amostras fixadas em formalina e incluídas em parafina – FFPE
As principais variáveis pré-analíticas que podem comprometer os resultados de testes são:
1 – Métodos de processamento: fixação (tempo de fixação, tipo de fixador e método de fixação) e variáveis envolvidas no processamento do tecido (qualidade dos fluidos de processamento, tipo e temperatura da parafina);
2 – Transporte e armazenamento do espécime: temperatura, duração, desidratação, dessecação e oxidação.

Em linhas gerais, recomenda-se fixação em formalina tamponada neutra a 10%, colocar no fixador em no máximo 1h e fixação por seis a 24hs. O volume do fixador no frasco de transporte do espécime deve ser equivalente a 10 vezes o volume do espécime. O transporte das amostras biológicas deve ser realizado em temperatura ambiente.
Os principais impactos na qualidade do espécime biológico são:

1 – Efeitos clínicos: diagnóstico incorreto por artefatos morfológicos e imuno-histoquímicos; potencial tratamento incorreto por interpretação equivocada do resultado de biomarcador devido aos artefatos;
2 – Resultados não reprodutíveis.

Coleta de amostras para testes de oncohematologia
As recomendações quanto ao anticoagulante, volume, conservação e estabilidade das amostras variam pouco entre os laboratórios clínicos, e segui-las corretamente é imprescindível para o sucesso do teste. Sendo o não atendimento a essas recomendações uma das principais causas de solicitação de recoleta.

1 – Atenção ao uso do anticoagulante adequado
A investigação das neoplasias hematológicas envolve a coleta das amostras para realização de testes diversos. A coleta de sangue e medula óssea com o anticoagulante inadequado interfere diretamente no sucesso do teste.
A heparina é um inibidor da reação em cadeia da polimerase (PCR), de modo que o anticoagulante recomendado na coleta de amostras para testes moleculares é o EDTA. Para a citogenética o anticoagulante adequado é a heparina sódica. O EDTA prejudica a cultura celular, pois atua quelando os íons de cálcio, interferindo na divisão celular. Quando uma amostra coletada em EDTA é colocada em cultura, as células não se dividem e desta forma não são obtidas células para análise dos cromossomos. Amostras para imunofenotipagem devem ser coletadas em EDTA, mas os esfregaços devem ser confeccionados em amostra sem anticoagulante.
Portanto, para a coleta de amostras que seguem para citogenética e biologia molecular é importante não misturar os dois tipos de anticoagulantes.

2 – A importância dos dados clínicos
A informação dos dados clínicos no pedido médico permite a execução de um teste mais direcionado à suspeita clínica, além de dar mais segurança na análise e interpretação dos resultados. Para a imunofenotipagem, os dados clínicos do paciente são utilizados para definição de um painel de anticorpos direcionado e mais específico para uma determinada doença. No caso do cariótipo de medula, os dados clínicos serão úteis para utilização de um protocolo de cultura específico para uma determinada doença, permitindo que o maior número possível de células alteradas se divida em cultura e seus cromossomos possam ser analisados.

Coleta de amostras de sangue para biópsia líquida
Ser um exame minimamente invasivo e com monitoramento em tempo real da eficácia do tratamento do câncer é a proposta da biópsia líquida, um exame capaz de detectar pequenos fragmentos de DNA provenientes do tumor (ctDNA) em uma amostra de sangue. Apesar de todas as promessas da biópsia líquida, a análise de ctDNA apresenta consideráveis desafios para os laboratórios de análise molecular:
– A quantidade de ctDNA circulante é limitada e são altamente degradados;
– Em geral, o ctDNA possui meia-vida de até 2 horas no plasma;
– A condição fisiológica do paciente também influencia na quantidade de ctDNA circulante.
– Finalmente, para aumentar a chance de detectar o ctDNA, boas práticas pré-analíticas devem ser empregadas para diminuir o rompimento de células nucleadas, o que reduz a sensibilidade do teste genético e aumenta a taxa de resultados falsos-negativos.

Então, como garantir que o ctDNA será suficiente para ser testado?

Muitas dessas características não podem ser controladas, mas um pré-analítico sendo feito de forma adequada pode aumentar a chance de obtenção de um ctDNA de qualidade:
1 – Tubos de coleta: tubos de coleta de sangue contendo moléculas anticoagulantes foram desenvolvidos para minimizar a lise de células nucleadas. Após a coleta de sangue nesses tubos, a amostra deve ser armazenada e enviada em temperatura ambiente para o laboratório. Na ausência de tubos especiais, a coleta pode ser feita em tubo EDTA, e nesse caso, o plasma deve ser separado por centrifugação em até 2 horas e armazenado em freezer (-20°C).
2 – Processamento: o sangue, coletado nesses tubos específicos, deverá ser processado em até três dias após coleta. O plasma obtido da centrifugação do sangue deverá ser isolado em novo tubo e novamente centrifugado. Depois, o plasma deverá seguir para o procedimento de extração de ctDNA ou armazenado a -80ºC até o momento da extração.

Referências
Lawce HJ, Brown M G. Cytogenetics – an overview. The AGT Cytogenetics laboratory manual. 3 ed. Philadelphia: Lippincott-Raven Publishers, 1997, p. 83-84.
Andriolo A et al. Recomendações da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML): coleta e preparo da amostra biológica. Barueri, SP: Manole: Minha Editora, 2014, p. 165- 172.

Nikolaev S, Lemmens L, Koessler T, Blouin JL, Nouspikel T. Circulating tumoral DNA: Preanalytical validation and quality control in a diagnostic laboratory. Anal Biochem. 2018 Feb 1; 542:34-39. doi: 10.1016/j.ab.2017.11.004.

Autores:
Lisandro Ferreira Lopes
Médico patologista pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Doutor em Ciências pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP).
Gerente Médico Corporativo de Anatomia Patológica do Instituto Hermes Pardini.

Fabiana Kalina Marques
Bióloga, mestre em Genética pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Pesquisadora do Instituto Hermes Pardini na área de oncologia/oncohematologia.

Priscila Daniele Ramos Cirillo
Bióloga, Mestre e Doutora em Genética e Câncer pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) e pós-doutora em Oncologia pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP).

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