Resultados de ensaio clínico randomizado de fase III demonstram eficácia de inibidor de IDH1 e IDH2 no tratamento de gliomas de grau 2
Gliomas são os cânceres de cérebro mais comuns entre adultos, sendo classificados em diversos subtipos e graus de acordo com uma combinação de características morfológicas e moleculares. Mutações de ganho de função nos genes das enzimas isocitrato desidrogenase 1 e 2 (IDH1 e IDH2) ocorrem em quase todos os gliomas de grau 2. Essas mutações promovem a hiperprodução do metabólito 2-hidroxiglutarato (2-HG) a partir de alfa-cetoglutarato (α-CG), e estão associadas a alterações no perfil de metilação de DNA e expressão gênica, levando a perda de diferenciação celular e tumorigênese, uma vez que diversas enzimas que promovem a metilação de DNA e de histonas são dependentes de α-CG e inibidas competitivamente por 2-HG.
A combinação entre radioterapia e quimioterapia adjuvante constitue-se como padrão de tratamento para gliomas de grau 3 apresentando mutação em IDH1/2 e para gliomas de grau 2 de alto risco de recidiva. Entretanto, essa abordagem não é curativa e está associada com disfunções neurocognitivas induzidas pela radioterapia, além de outros efeitos tóxicos. Para evitar esses efeitos, alguns pacientes não iniciam esse tratamento logo após a cirurgia, e adota-se uma abordagem de observação e espera, que posterga a exposição desses pacientes à radioterapia e à quimioterapia, preservando sua qualidade de vida.
O Vorasidenibe é um inibidor de IDH1 e 2 com capacidade de transpor a barreira hemato-encefálica e que demonstrou bom perfil de segurança e atividade antitumoral em avaliações clínicas iniciais. Seu uso foi associado a uma redução de 90% na concentração de 2-HG em tumores e à reversão dos perfis epigenético e de expressão gênica associados às mutações. Recentemente, resultados de análises interinas provenientes do ensaio clínico randomizado de fase III INDIGO (NCT04164901) foram publicados na revista New England Journal of Medicine, e demonstram a eficácia desse medicamento como tratamento adjuvante em pacientes com glioma de grau 2 mutados para IDH1/2.
O estudo envolveu um total de 331 pacientes com glioma de grau 2 mutado para IDH1/2, de idade mínima de 12 anos, que haviam passado por ao menos uma cirurgia para remoção tumoral com doença residual ou recidiva e que não haviam recebido tratamento adjuvante, recrutados entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2022. Após randomização (1:1) estratificada por idade e pelo status de co-deleção 1p/19q, os pacientes foram alocados para receber Vorasidenibe (40mg, n = 168) ou placebo (n = 163) por via oral, uma vez ao dia, em ciclos de 28 dias. O desfecho primário avaliado foi a sobrevida livre de progressão, definida como progressão em exames de imagem ou morte por qualquer causa. Desfechos secundários reportados na publicação incluíram tempo para próximo o tratamento, resposta global e segurança. Outros desfechos secundários do estudo não incluídos na publicação são: taxa de crescimento tumoral, qualidade de vida e sobrevida global.
No seguimento mediano de 14,2 meses 226 pacientes (68,3%) ainda estavam recebendo os tratamentos do estudo e não foram reportadas mortes em qualquer grupo. Os resultados demonstraram um ganho de sobrevida livre de progressão significativo no grupo tratado com Vorasidenibe, já que a taxa de progressão nesse grupo foi de 28% (47/168) enquanto no grupo placebo foi de 54% (88/163) e as sobrevidas livres de progressão medianas nesses grupos foram, respectivamente, 27,7 meses (IC95%: 17 – NA) e 11,1 meses (IC95%: 11 – 13,7), resultando em um risco relativo (RR) de 0,39 (IC95%: 0,27 – 0,56; P < 0,001). O tempo para próxima intervenção também foi maior entre pacientes recebendo Vorasidenibe (RR: 0,26; IC95%: 0,15 – 0,43; P < 0,001). Os resultados foram consistentes entre os subgrupos analisados, incluindo subgrupos definidos pela presença ou não de co-deleção 1p/19q.
Quanto ao perfil de segurança, eventos adversos de grau 3 foram reportados em 38 (22,8%) dos pacientes que receberam Vorasidenibe e em 22 (13,5%) dos pacientes no grupo placebo. Os eventos adversos de grau 3 mais comuns no grupo tratado com Vorasidenibe foram: aumento de ALT (9,6% contra 0 no grupo placebo), AST (4,2% contra 0 no grupo placebo) e GGT (3% contra 1,2% no grupo placebo). Eventos adversos sérios relacionados ao Vorasidenibe ocorreram em 1,8% dos pacientes tratados com esse medicamento. Eventos adversos levaram ao abandono do tratamento em 6 pacientes (3,6%) do grupo vorasidenibe e em 2 (1,2%) pacientes do grupo placebo, e a reduções de dose em 18 (10,5%) e 5 (3,1%) pacientes desses grupos, respectivamente. Interrupções no tratamento devido a eventos adversos ocorreram em 50 (29,9%) dos pacientes no grupo vorasidenibe e em 37 (22,7%) dos pacientes no grupo placebo.
Assim, os resultados dessa análise interina demonstram que o vorasidenibe é capaz de aumentar a sobrevida livre de progressão de pacientes com glioma de grau 2 mutado para IDH1/2 com doença residual ou recidivada após cirurgia, e atrasar o tempo para uma nova intervenção, sugerindo essa abordagem como uma alternativa de tratamento para esses pacientes. Novos resultados desse estudo, incluindo os resultados de sobrevida global e de taxa de crescimento tumoral, bem como análises moleculares de biópsias pré-tratamento, que estão em andamento, são aguardadas para confirmar a eficácia desse medicamento bem como elucidar potenciais mecanismos e marcadores moleculares para esse tratamento.
Referência: Mellinghoff et al. Vorasidenib in IDH1- or IDH2-Mutant Low-Grade Glioma. The New England Journal of Medicine. 2023. Doi: 10.1056/NEJMoa2304194
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