Neste final de janeiro o “Movimento Brasil sem câncer do colo do útero”, liderado pelo Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA) do LACOG, lançou uma campanha nas redes sociais com o mote “nós seremos a primeira geração sem câncer do colo do útero”. O lema da campanha mostra o quanto o Brasil, como a maior parte dos países de baixa renda que implementaram campanhas de vacinação contra o papilomavírus humano (HPV), ainda está longe de uma cobertura satisfatória e da erradicação do vírus.
“Nós oncologistas que formamos o Movimento sempre nos cobramos pelas nossas poucas ações na prevenção dessa doença que pode não existir“, comenta a Dra. Angélica Nogueira, presidente do grupo e uma das organizadoras da campanha. “Com estratégias simples, como os exames de Papanicolau e a vacinação, países desenvolvidos conseguiram que o câncer do colo do útero deixasse de ser um problema de saúde pública”, explica a Dra. Nogueira.
No Brasil, nem a campanha em prol da realização periódica do Papanicolau e nem a cobertura vacinal atingiram as metas para proteger efetivamente a população. Esta característica da baixa adesão às estratégias preventivas contra o HPV é o que faz com que sua distribuição geográfica seja concentrada em países em desenvolvimento, e nas regiões mais socioeconomicamente desfavorecidas de cada país.
“Existem bolsões, na África Subsaariana e na América Latina, por exemplo, nos quais o câncer do colo do útero é um problema de saúde pública. Isso mostra o quanto esta é uma doença evitável, desde que se faça a prevenção efetivamente. É uma doença diretamente proporcional à desinformação e à dificuldade de acesso à saúde”, comenta a oncologista.
“Mesmo o Papanicolau tendo sido introduzido na rede pública desde a década de 1980, ele é muito subutilizado. Precisaríamos atingir uma meta mínima de 30% ao ano para chegar à cobertura de 90% das mulheres da faixa-etária indicada em três anos”, diz a Dra. Nogueira, ressaltando que o número real de cobertura anual é de 16%. “E, reforçando o efeito da desigualdade socioeconômica na incidência do vírus, no Estado do Maranhão, essa cobertura é de apenas 4%”.
Além da prevenção, o exame é importante para o acompanhamento de pacientes que já apresentem verrugas ou neoplasias intra-epiteliais cervicais (NIC), para que se possa impedir o alastramento das lesões bem como, no caso das NIC, impedir o avanço para formas invasivas. “Como a progressão é muito lenta, este intervalo de três anos é seguro para que se aja antes do desenvolvimento do câncer. O problema é que a parcela de mulheres que segue essa rotina ainda está muito abaixo do necessário”.
Os dados em relação à vacina, no que diz respeito ao ano de implementação, pareciam mais animadores do que os do Papanicolau. Com a introdução da vacinação para crianças e adolescentes nas escolas da rede pública, em 2014, o Brasil chegou a atingir, segundo a Dra. Nogueira, mais de 90% da meta da campanha.
Mas este foi o único ano no qual a vacina obteve este grande sucesso. “Seria importante retomar essa prática, especialmente na esfera Federal. No ano seguinte ao da implementação, quando se desvinculou a vacinação das escolas, houve uma queda de 23% na cobertura”, explica a Dra. Angélica. “Hoje, a vacina tem adesão de apenas 52% em meninas e 22% em meninos, o que é preocupante. A importância de vincular a atividade escolar à vacinação contra o HPV e outras doenças é que, ao chegar na adolescência, normalmente perde-se o hábito de frequentar os postos de saúde.”
A Dra. Nogueira diz que a comunidade médica tem grande responsabilidade na construção de um quadro mais positivo para a prevenção e monitoramento do HPV, bem como na promoção de nossa primeira geração de adolescentes livres do risco de câncer do colo do útero. “Nosso movimento surgiu para fazer uma diferença nesse quadro, e muitos médicos estão replicando o material da nossa campanha. Mas precisamos fazer mais. É fundamental a disseminação de informações sobre essas estratégias, e sobre outras que possam surgir, como as vacinas terapêuticas que têm sido desenvolvidas. Adicionalmente, é com informação confiável que se combatem fenômenos como o movimento anti-vacina e seus argumentos sem embasamento”, completa.
Além de influenciar diretamente a tomada de decisão de pacientes, os médicos podem, segundo a Dra. Nogueira, estimular a adesão de outros membros da família a métodos preventivos. Estimular a vacinação contra o HPV de filhas de pacientes, esclarecer dúvidas a respeito da doença e da imunização e criar um ambiente no qual a confiança seja conquistada são maneiras de atuar em prol da prevenção de doenças evitáveis, como o câncer do colo do útero.
A presidente do grupo EVA reforça ainda que oncologistas e ginecologistas podem participar ativamente da disseminação da informação em diversas esferas de mais amplo acesso, citando as salas de aula onde se formam novos profissionais da saúde, redes sociais e até mesmo vídeos e podcasts como possibilidades de atuação. “O poder da fala do médico não pode ser desprezado, até porque nós temos a responsabilidade de divulgar que o câncer do colo do útero é uma doença que pode não existir”.
Alameda Campinas, 579 – Jardim Paulista, São Paulo – SP, 01404-100
CEO: Thomas Almeida
Editor científico: Paulo Cavalcanti
Redatora: Bruna Marchetti
© 2020 Oncologia Brasil
A Oncologia Brasil é uma empresa do Grupo MDHealth. Não provemos prescrições, consultas ou conselhos médicos, assim como não realizamos diagnósticos ou
tratamentos.